15 de maio de 2009

E o destino os uniu

Irreverentes, despojados, engraçados e, principalmente, muito falantes. Assim são os cinco integrantes do grupo Bons Tempos. Alfeu (cavaquinho e vocal), Caco (vocal solo e percussões), Chiquinho (pandeiro), Elder (timba e vocal) e Newton (violão de sete cordas e vocal), são amigos que por acaso do destino se uniram para tocar samba e se divertir. Essa história, que começou na década de 80, dura até os dias de hoje. Esses simpáticos sambistas me receberam para contar um pouco de sua história.

JF – Como vocês se conheceram?


Alfeu – Basicamente posso dizer que nos conhecemos no meio universitário. A verdade é que o núcleo formador do Bons Tempos começou no Jardim Proença. E depois disso a vida foi nos unindo.


JF – Como surgiu a idéia de criar a banda?


Alfeu - O Elder e o Chico são amigos de infância, eles moravam no mesmo bairro. Eu conheci o Elder no colégio. Nós dois entramos no Cotuca, na Unicamp. Durante o colégio a gente teve que fazer um trabalho para a professora de educação artística. E a gente queria fazer um trabalho que não desse trabalho. A gente fazia tecnologia de alimentos, não tinha nada a ver com o meio artístico. Mas tivemos a idéia de fazer a apresentação de uma música. O Elder tocava afoxé, eu brincava com os meus irmãos de tocar timba. Depois de um tempo eu comecei a aprender tocar cavaquinho. Foi assim que eu conheci o Elder e o Chico. Eu já estava fazendo faculdade na Unicamp e continuava tocando com o Chico e o Elder meio que de brincadeira. Quando eu entrei na Unicamp que eu conheci o Caco, que estava na minha classe. E o Newton fazia Unicamp também, mas não na nossa sala. No primeiro ano da faculdade um amigo nosso fez um convite para irmos cantar em Fernandópolis. E a gente fez um show lá em julho. Só que o Cezar, que tocava na banda na época, não pode ir. Ai o Newton, que tocava violão, foi com a gente. E rolou uma coisa muito boa. A gente não tem certeza de quando exatamente surgiu a banda, mas foi por volta de 1984 que o Bons Tempos existe com a formação atual: eu (Alfeu) no cavaquinho, o Chico no pandeiro, o Elder na timba, o Newton com o violão e o Caco na percussão.


JF – Além dos shows normais, o grupo Bons Tempos faz também shows teatrais. Como começou o projeto? Como surgem os temas para estes espetáculos?


Alfeu – O Newton é o cara que tem essas idéias de idealizar projetos. E ele sugeriu para a gente fazer um projeto em homenagem a alguma coisa. Então o primeiro trabalho que a gente fez com o formato de show para teatro foi o “A época de ouro do rádio”, em 1991, que fazia homenagem a cantores do rádio.


Newton - Ainda naquela época, a Prefeitura tinha um programa, no qual você se inscrevia com um projeto artístico e quem ganhava levava uma graninha para montar o projeto. E a gente estava procurando algo a mais do que só tocar em bar durante a noite. Já tínhamos saído da faculdade, o Elder e o Alfeu montaram um bar, o Almanaque Bar. Cada um já estava com uma vida definida. Queríamos mudar. E então veio a idéia de montar um show sobre a era de ouro do rádio. Montamos no palco um estúdio de rádio da década de 30, 40 onde nós éramos os músicos, havia um locutor que fazia como uma locução de rádio. Estudamos a época, como era a postura do locutor, repertório e montamos uma historinha. Começamos a aprender coisas de teatro, falar em cena, se colocar e tal. Esse foi o primeiro show que a gente fez. Deu tão certo que até hoje a gente faz esse tipo de trabalho. Escolhemos um tema para encenar, fazer um espetáculo musical, tem figurino, texto, etc. No último espetáculo, que foi sobre o Chico Buarque, a gente fez uma coisa nova que foi dançar. Nunca tínhamos dançado no palco. A gente gosta disso e tem uma enorme facilidade de trabalhar os cinco juntos. Quando vamos montar um show nós sentamos, montamos o repertório, a cena. Somos muito criativos para conceber espetáculos. Em 1994, a gente teve a idéia de fazer um outro espetáculo sobre Ary Barroso: Ary, o Brasileiro. Então tivemos a idéia e fomos atrás do Sérgio Cabral, um jornalista e um dos fundadores do Pasquim. Ele é entendedor de música brasileira. Na época ele estava fazendo a biografia do Ary Barroso. Pedimos para ele fazer o roteiro do show. Nós fomos ao Rio e ele aceitou nossa proposta, depois de um pouco de insistência. Com tudo pronto, a Dpaschoal patrocinou o nosso show por duas temporadas em Campinas. Em 1995, topou patrocinar de novo o show no Rio de Janeiro. Um dia a gente estava lá no Rio e conhecemos o Albino Pinheiro, um dos fundadores da Banda de Ipanema, era o cara que agitava a vida cultural do Rio. Ele era produtor de um projeto que chamava seis e meia: todo dias as 18:30 no teatro João Caetano tinha um grande show e ele convidou a Bons Tempos para passar uma semana se apresentando lá, e ficamos em cartaz. Uma coisa legal da nossa carreira foi um dia que a gente estava tocando no teatro João Caetano e os Cariocas foram lá assistir a gente. E a gente os adora. Foi muito prazeroso poder tocar para eles. A história da música popular brasileira ir assistir você.


JF – E depois vocês fizeram o que?


Alfeu – Depois disso continuamos a fazer os nossos shows menores, com músicas de autoria nossa aqui nos bares de Campinas. Em 2003 fizemos a remontagem do Ary, o Brasileiro. Nós tínhamos uma produtora e pensando o que poderíamos fazer para inovar o Newton me fala: “Po Alfeu esse ano é o centenário de aniversário do Ary Barroso e se a gente remontasse aquele espetáculo?”. Conversas depois, nós decidimos encarar o desafio. Fomos em busca de patrocínio. No nosso projeto constavam 18 shows pelo interior do estado de São Paulo. A reposta da DPaschoal foi que eles poderiam patrocinar zero shows. Mandamos para algumas outras empresas nas quais a gente tinha contato e que poderiam ter algum interesse em patrocinar. Um belo dia recebi um telefonema de um amigo que trabalhava na Petrobrás, ele me disse que no mesmo ano seria aniversário de 50 anos da Petrobrás. E ele pensou que seria legal para a empresa patrocinar um evento cultural tipicamente brasileiro, Ary Barroso era um artista verde e amarelo, nacionalista. E isso tinha a ver com a imagem da Petrobrás. Ele me disse que a empresa topava patrocinar o show, mas ao invés de 18 eles queriam 54 shows pelo Brasil inteiro. E ai rolou. Na verdade fizemos 56 shows de Porto Alegre até Manaus, passando por 33 cidades diferentes. Fizemos show até na plataforma de petróleo no meio do mar, tocamos no teatro Amazonas.


Newton – Foi uma grande aventura. Um dos grandes sucessos do Grupo Bons Tempos.


Alfeu – O mais interessante que eu vejo dessa turnê, fazendo agora uma reflexão, o meu grande medo era ter brigas. Nós cinco já tínhamos intimidade, mas esse espetáculo envolve muita gente, produtor, ator, técnicos, montador, músicos. Mas acho que a gente contagiou a todos com o nosso jeito de brincar um com o outro. Todo mundo se entrosou super bem. Quando a gente acabou a turnê, que nós nos tocamos que não tínhamos gravado um DVD de nenhum show. Então voltamos a Petrobrás pedindo para fazer mais um show em Campinas, 2 dias, para fazer a gravação do CD e DVD. Eles deram mais uma verba de patrocínio. Então, em 2005, fizemos mais dois dias de apresentação no Centro de Convivência e gravamos o CD e DVD. Fizemos depois o mesmo show com o Chico Buarque. E foi uma sucessão. Foi tanto sucesso que decidimos remontar ano passado (2008) de novo. Fizemos por dois dias aqui em Campinas. E a casa estava lotada. Decidimos fazer mais dois dias, lotado de novo. Um mês e meio depois decidimos fazer de novo e lotou de novo as duas sessões. É um momento na carreira da gente muito importante.


JF – E em qual projeto vocês estão trabalhando agora?


Alfeu – Depois disso tudo concluído, nós começamos a trabalhar no CD de aniversário do grupo, que estamos completando 25 anos.


JL – E porque samba?


Alfeu – O Chico e o Elder já tocavam violão e pandeiro. O pai do Caco canta e então o Caco sempre esteve envolvido com música. Mas o principal acho que é o violão, que é um instrumento muito característico da música popular. E num primeiro momento o que se tocava com violão? Bossa Nova. Na nossa época, quando estávamos na faculdade, as pessoas que a gente ouvia, todos os artistas consagrados, que era Chico Buarque, Caetano Veloso, Djavan, esse pessoal todo apesar de ter origem diferenciada eles sempre tinham o samba em sua carreira. O Djavan tem um disco inteiro de samba. O samba surge naturalmente na vida do brasileiro, é uma coisa mais simples, de entendimento fácil. Mais acima de tudo o ambiente universitário que a gente vivia foi essencial para nos apresentar para esse estilo musical. O samba estava em todo lugar nas universidades, havia muitas rodas de samba na Unicamp. E estávamos também saindo de uma ditadura, então tinha Roda Viva, Apesar de Você que nos empolgava.


JF – Quem são os grandes ídolos da carreira do Bons Tempos?


Alfeu – Vai ser difícil falar, mas de cara já falo o principal: Chico Buarque. Depois vem Paulinho da Viola, Cartola. Não tem como você falar de todos. De intérprete que a gente sempre ouviu a vida inteira foi MPB4.


JF – Quais as maiores dificuldades que vocês encontraram?


Alfeu – Não tem nenhuma dificuldade. Só o que dá trabalho é mulher e dinheiro. E a gente nunca tinha nem mulher nem dinheiro (risos). Mas sério, nós nunca nos encaramos muito profissionalmente, de abandonar tudo e ir viver só da música, por isso não tivemos grandes problemas. Sempre foi associado com divertimento. É uma fonte de prazer que a gente faz com muito carinho e bom humor.


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